“Reformacróstica”
Por Marco Antônio de Araújo Bueno
Rebenta o sol na terra adormecida
Enquanto ainda dormem seus senhores;
Fingindo-se de homem pela vida
Omite a dor num manto de labores.
Rasteja-se no campo qual ferida
(Mais há no campo a cana do que flores)
Até que chegue a hora da comida,
Aguada e fria em perda e sabores.
Graceja e canta, pois que a “vida é bela”,
Rogando aos céus apenas por saúde
Até que a morte o venha, enfim, colher...
Retoma a sua cruz num gesto rude,
Inerte, pois que desconhece ainda
A hora em que nem saberá comer.
abril 17, 2007
"Reforma Acróstica": Soneto dos anos 70, formalmente antigo quanto a aspiração que se comemora neste 19 de Abril, dia da REforma Agrária...
Assinar:
Postar comentários (Atom)
10 comentários:
Qua, 18 de Abr de 2007 9:50 am
Grande Marco,
Gostei do soneto! Primeiro, porque entendi (rarara!) e segundo porque € ¦é bonito (imagens po€ ¦éticas fortes) e com um tema forte socialmente.
Esse trabalho de semi-escravid€ ¦ão ainda existe e € ¦é negligenciado quando se batiza de her€ ¦óis os antes batizados como senhores de engenho. Essa cruz que retomam € ¦é da vida ou € ¦é imposta por nossa sociedade quando desvia os olhos? O € ¦último terceto me causou indigna€ ¦ção pela resigna€ ¦ção desse homem rude que pega sua cruz.
Tenho um poema que comecei na oficina e n€ ¦ão terminei sobre o trabalho do homem no campo. Ler seu poema me encheu de vontade de pegar a enxada e partir pro cultivo desse latif€ ¦úndio improdutivo branco que deixei.
Grande abra€ ¦ço,
Rodolfo.
Moderadores:
Marco, bom dia! Maravilhoso o soneto-acróstico pela reforma agrária. Vim aqui, inclusive, por isso mesmo,... para solicitar que abrisse um tópico em
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=29820289
para ali postar os sonetos de sua autoria. Conto com sua valiosa colaboração.
Um abraço.
André L. Soares
Marco: mesmo sendo um pouco novo por aqui e n€ ¦ão sabendo muito como as coisas funcionam, tomei a liberdade de fazer alguns coment€ ¦ários sobre seu poema "Reformacr€ ¦óstica".
1) Gostei muito do poema. A id€ ¦éia de fazer um acr€ ¦óstico em forma de soneto decass€ ¦ílabo cl€ ¦ássico em versos her€ ¦óicos € ¦é muito ousada. Voc€ ¦ê se saiu bem.
2) A repeti€ ¦ção do termo "no campo" nos versos 5€ ¦º e 6€ ¦º me incomodou um pouco.
3) Pelo que conhe€ ¦ço de regras cl€ ¦ássicas, a letra "h" € ¦é invis€ ¦ível para as contagens m€ ¦étricas, n€ ¦ão impedindo que as elis€ ¦ões ocorram. Com isso, vejo problemas nos seguintes versos:
Fingindo-se de homem pela vida
Fin / gin / do / se / deho / mem / pe / la / vi = 9 s€ ¦ílabas po€ ¦éticas
At€ ¦é que chegue a hora da comida
A / t€ ¦é / que / che / gueaho / ra / da / co / mi = 9 s€ ¦ílabas po€ ¦éticas
A hora em que nem saber€ ¦á comer
Aho / ra / em / que / nem / sa / be / r€ ¦á / co / mer = 9 s€ ¦ílabas po€ ¦éticas
Ao meu ver, todos os outros versos est€ ¦ão metricamente perfeitos (decass€ ¦ílabos, her€ ¦óicos em 2€ ¦ª, 4€ ¦ª, 6€ ¦ª e 10€ ¦ª).
obs: se eu tiver errado, por favor me corrija.
4) N€ ¦ão entendi muito bem a organiza€ ¦ção das rimas dos dois tercetos: CDE - DFE? Voc€ ¦ê optou por n€ ¦ão rimar as palavras "bela" e "ainda"?
Os coment€ ¦ários 3 e 4 referem-se ao molde cl€ ¦ássico, todos temos total liberdade para n€ ¦ão segui-lo...
Bom, espero ter ajudado!
abra€ ¦ço
Jardel.
>Marco
Gostei da forma mais cl€ ¦ássica, ficou delicado e super-po€ ¦ético. Gostei tamb€ ¦ém do tema e da forma de abord€ ¦á-lo. Do meu ponto de vista entraria num livro redondinho
Beijos
Simone
Marco Antônio de Araújo Bueno disse...
Jardel, recebo com grande satisfação o comentário que fez sobre meu
"soneto". As aspas ficam por conta da minha ousadia, essa sim, contra
os cânones, que você retoma na crítica à metrificação,com muita
elegância e competência. Foi opção minha sim, a escolha de não rimar
o final de um dos versos dos tercetos.Uma quebra ostensiva para
trazer à tona um conflito entre os adjetivos "linda" (quase
obrigatório, pelo
paradigma) e "bela" (autorizado pelo sintágma e pela demarcação da
quebra).Seria uma racionalização justificar, pela mesma predisposição
à quebra, a idéia de escandir a tonicidade de "homem" ou não
compactar o "h" em outros versos.Aínda mais quando suas correções
espelham um certo efeito de pregnância em meu senso ritmico: minha
versificação tende ao eneassílabo (tônicas 3/6/9)! Herança do impacto
de um "I Juca Parama", com toda certeza. Meus melhores "piores
sonetos" eram assim na segunda metade dos anos setenta. Aliás, o
próprio recurso ao acróstico servia para "amaciar" a censura e outros
problemas com a publicação em jornais e revistas, quando este soneto
teve outros títulos como "Nostalgia do Campo" e "Inapetência e
Saudade"...Funcionou! Quero saldar sua presença no Turma3 e lhe
agradecer a oportunidade de rememorar essas aventuras poéticas.
Grande abraço
5:44 PM
disse...
Prezado Marco,
Fico muito contente quando encontro mais um sonetista. Tenho um colega sonetista que diz: quando um poeta clássico morre, é mais um poeta no mundo que não é substituído. Ele sempre diz que, de umas décadas pra cá, viramos uma espécie em extinção. Concordo com ele. É muito e muito difícil encontrar pessoas para discutir poemas clássicos hoje em dia. Com isso, as revisões de sonetos ficam complicadas, né?
Embora escreva sempre em decassílabos heróicos, também admiro os alexandrinos e os eneassílabos. Acho interessante, pois a configuração 3-6-9 ou a 3-6-9-12 dá às tônicas um espaçamento idêntico, o que cria um ritmo muito forte. Isso me lembra elementos matemáticos. Aliás, acredito que a matemática e a poesia clássica estão muito mais próximos do que as pessoas imaginam! rsrsrs
Você já ouviu falar em Coroa de Sonetos?
abraço
Jardel.
6:35 PM
El Faroeste 19 Abr
finalmente um soneto que grita
e q nao fica sonhando com fadas e castelos
ou lamuriando a escuridão da alma humana
encanta-me o zelo com a tematica e com forma
Avante, soldado da palavra
{Do site "Recanto das Letras")
Marco Antônio,
Sua Reforma Agrária, ficou maravilhosa! Parabéns! Adorei! Um grande abraço,
Ivone
Enviado por IVONE CARVALHO em 25/05/2007 03:00
para o texto: "Reformacróstica" (T500199)
Bom que te tenham colhido, não a morte nem outrém, com acento bem no em, como diz o poema, mas que te tenham colhido, e que, a colheradas, você nos dê algo de sua poesia. Pois é poesia.
Enviado por Daniel (não autenticado*) em 27/05/2007 20:37
para o texto: "Reformacróstica" (T500199)
Ivy Menon disse...
Marco Antonio,
Parece até que viveu, ao menos, uma semana de boia-fria (rsrsrs)!
Realmente, eu cantava, enquanto capinava o soja, "realava" girassol, cortava cana, arrancava amendoim... A comida não era aguada, porque minha mãe dava vida a ela, dava-se, nela.
Deixo os comentários técnicos para o técnicos. Sou aprendiz.
beijim
6:33 PM
{Obs.: A autora, publicada, venceu recente concurso com um poema denominado "Bóia Fria". Marco}
“Reforma Acróstica” é um soneto muito bonito, impossível de ser lido sem ser tocado. “Até que...”, utilizado duas vezes no texto, funciona como chave, como momento, como limite. O desdobramento das palavras a partir dessa expressão e de sua variante alçam o soneto e o leitor ao plano da dignidade
Carlos- São Paulo (publicitário)
Postar um comentário